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#09: novembro - ser medíocre é um bom começo
sobre inconstância & crescimento
nessa edição:
trabalhar, trabalhar e trabalhar :)
ser medíocre é um bom começo
O medo do ridículo me faz escrever.
Não lembro quando comecei a escrever. Não lembro quando me sentei, abri um documento e pensei “vou escrever”, porque isso sempre aconteceu comigo. Minhas memórias mais antigas envolvem histórias rabiscadas em papel sulfite e pregadas com o grampeador da loja dos meus pais. Além disso, eu fiz o caminho “abrir word + escrever + jogar fora” tantas, tantas, tantas vezes que, para mim, o começo de tudo não importa mais. Para mim, o agora é o que faz mais sentido.
E, bem, como todo mundo que faz terapia, acabei descobrindo muitas coisas sobre mim mesma, e nem todas elas eram legais. Risos.
Algumas delas, na verdade, eram feias, vulneráveis e tristes. Não gosto de abrir o peito e deixar meu coração tão exposto assim, mas precisava falar sobre isso para poder chegar em um ponto específico da minha jornada como escritora e no meu ano de 2023.
Eu morro de medo de ser ridicularizada. Checo informações duas, quatro, dez vezes. Odeio dar opiniões públicas e (é bobo, eu sei) tenho crises de ansiedade quando lembro que as pessoas mundo afora que me conhecem tem opiniões sobre mim.
Não sou uma pessoa 100% legal e tenho plena consciência disso. Às vezes, sou demais, e muitas vezes, sou de menos. Tenho muitas opiniões. Não sei disfarçar quando me deparo com opiniões de que não gosto ou das quais discordo. Sou um pouco encrenqueira, na verdade. Preciso de atrito para seguir em frente, porque, se as coisas estacionam, eu fico extremamente depressiva. Eu quero que as pessoas vejam que não gostei de algo, é mais forte do que eu. Minha maior arma é o silêncio, porque o silêncio para mim significa falta, significa desdém. Significa desinteresse.
Cresci em uma casa onde fui pouco ouvida e, graças a isso, passei a escrever. Quando a gente escreve, escolhe palavra por palavra. Se errar, consegue apagar. Se o texto ficar ruim, dá para consertar. Quando a gente dispara palavras, muitas vezes é quase impossível retirá-las. Mas quando se trata de escrever… Escrever preenche lacunas que tenho dentro da minha cabeça. Gosto de escrever. Me sinto confortável escrevendo.
Hoje em dia, eu me articulo bem também, mas antes disso eu fingi muito. Morria de medo de ser medíocre em tudo o que fazia. Quando percebi que era ruim nas exatas, abandonei o barco e girei na direção das humanas. Eu podia ser terrivelmente ruim em uma área, mas não aceitaria ser medíocre em outra.
Infelizmente, cresci em uma casa onde fui cobrada para ser tudo ou nada. Resquícios disso se enraizaram no meu cérebro, e tenho problemas com erros, falhas e não conseguir alcançar as coisas que quero e/ou preciso. Mas a verdade é que, por mais que eu amasse escrever e buscasse ser a melhor nisso enquanto crescia, nas escolas em que estudava, nem sempre eu era.
Nunca fui boa em redação, por exemplo. Eu divagava demais, e quando descobri que redações são mais fórmulas que devem ser seguidas do que escrita de fato, me senti pessoalmente ofendida. “Até nisso?”, eu me perguntava, estressada. “Até nisso a gente precisa seguir padrões para ir bem?”
E sim, até nisso.
A vida melhorou quando eu entendi que era medíocre no que estava fazendo porque era meu tempo de ser medíocre — eu teria tempo para falhar, para aprender, para crescer… e tudo bem. Eu estava na média, mesmo que amasse muito fazer algo. Só não conseguia aturar a ideia de permanecer na média. Tudo bem, eu pensava. Ser medíocre é só começar. Ser medíocre é um bom começo.
E ser medíocre ainda é um bom começo.
Mas eu ainda tinha medo do ridículo. Isso, somado à minha fome de devorar o mundo que estava ao meu alcance, fez com que eu continuasse escrevendo. E jogando fora. E escrevendo. E publicando. E escrevendo. E testando histórias em plataformas online. Aprendi muito sendo uma jovem apavorada e covarde. Quando somos covardes, tentamos nos preservar. Tudo dá medo: das menores situações até as maiores. A gente faz as coisas em silêncio. Só que um dos meus grandes problemas é que eu estava sempre transbordando. Vazando pelas beiradas. Devia ser a ansiedade, que depois virou compulsão alimentar, que depois virou anos de terapia. E hoje eu estou bem. Parei de comer desenfreadamente e parei de engolir no seco as coisas que gostaria de dizer.
Só que eu também acabei criando um casco, uma certa… resistência. Gato escaldado tem medo de água fria, afinal de contas. Mas foi bom, porque eu aprendi a testar terrenos. Aprendi a interpretar melhor textos, aprendi a ler nas entrelinhas, aprendi a recuar quando necessário. Não só isso: aprendi primeiro a como ser alguém antes de querer me jogar em uma carreira que exige uma carga de tempo enorme com o próprio ego. E apesar de eu ter meu ego em uma coleira, às vezes ele rosna de volta.
E eu me pergunto: é assim com todo mundo? Todo mundo tem essas inseguranças? Esse medo de ser insuficiente, de ser ridicularizado por algo que você empenhou tanto esforço?
De qualquer forma, eu só queria escrever um pouco sobre como alguns processos humanos afetam diretamente a arte que a gente cria. Quer dizer, todos esses sentimentos sempre afetam, mas eu fiz um recorte especial dos meus medos mais sinceros.
Acabei contando isso tudo para comentar que meu livro Enquanto o universo não desmoronar vai ser publicado pela Editora Rocco em 2024. É um romance coming of age sobre luto, amadurecimento e culpa, e eu ainda quero escrever uma newsletter só sobre isso e também comentar sobre todo o processo (até porque eu estou super empolgada com TUDO!!!!).
Gosto de comentar que essa história é um ponto fora da curva para mim, porque também escrevo contemporâneos, apesar de amar (e focar mais no) fantástico. Além disso, esse livro em especial teve um processo de escrita longo e estranho de cinco anos. É uma história mais pessoal (mas não é sobre mim), que fala sobre como perder pessoas que amamos acaba mudando o curso da nossa vida, e como é se ver perdido no nada que o luto consegue ser em algumas situações.
Espero de verdade que as pessoas não pressuponham que se trata de um romance romântico, porque essa história não é sobre isso. Nunca foi. Ironicamente, ela é repleta de amor (e da falta dele), e eu estou animada para que esse livro se torne real e que as pessoas o leiam.
Com cada livro, com cada história que escrevi, eu tinha um propósito. Enquanto o universo não desmoronar, de título longo e estranho, teve uma razão muito clara na minha cabeça. Eu precisava falar sobre o luto, porque o luto era a única coisa na qual pensava. Precisava escrever sobre a saudade, porque saudade era a palavra que oscilava na minha cabeça dia sim, dia não. Sempre quis ser autora, escritora profissional, mas nunca deixo de me lembrar da minha motivação pessoal para escrever, que é bem simples: quero contar histórias específicas.
E quero contar todas essas histórias. As mais arriscadas, as mais estranhas, as mais clichês, as mais fofas. Quero ser uma carta coringa, mas quero que as pessoas saibam que eu escrevi essa história e aquela história. Enfim. Se eu consegui isso, ainda não sei, mas posso dizer com toda a certeza que estou trabalhando para que isso aconteça.
Até lá, vou guardando todo medo dentro da caixa do Já Era.
Porque se foi preciso ser medíocre no começo para que eu pudesse crescer, como pessoa e como escritora, acho que já posso admitir que saí dessa zona.
Ufa.
P.S.: Acho que agora é uma hora legal de comentar que todo ano, no meu aniversário, eu escrevo uma carta para a minha eu do futuro. Quando me sinto chateada ou se me lembro por acaso, eu releio essa carta.
E, apesar de ter algumas coisas pessoais, queria deixar um trecho da carta que escrevi para a eu de 25 anos:
"(...) e talvez nesse momento eu esteja um tico triste e um tico cansada, mas saiba que tudo na vida muda, tudo é passageiro, e, por alguma razão, essa é a graça de viver — a inconstância do coração humano. (...) Obrigada por todas as vezes em que respirou fundo."
:)
fanart !!!
Eu acho tão legal quando eu recebo uma FANART de uma história que euzinha escrevi. Vou deixar duas aqui, uma mais recente e uma outra que eu recebi tem um tempo, mas as duas são de Beleza monstruosa.

Fanart de Beleza monstruosa, que foi feita pela @clarxmor (Twitter!)

Fanart da @opsnoh (Instagram)
Com carinho,
e pensando em cada universo que anda desmoronando por aí,