- Ellipse
- Posts
- #02: abril - só existe uma de mim
#02: abril - só existe uma de mim
sobre voz autoral & criar coisas
nessa EDIÇÃO:
criatividade como exercício (?);
artistas versus validação (feat. rede social);
todos os artistas roubam e você deveria saber disso.
AVISO: essa newsletter terá uma quantidade considerável de referências a Taylor Swift (e eu não me desculpo por isso).
VIDA CRIATIVA PARA OS MEDROSOS
Meu primeiro livro foi uma fantasia.
Ao mesmo tempo que isso foi umas piores decisões que eu já tive, hoje em dia eu consigo enxergar o porque dela.
E você deve estar pensando: “oras bolas, mas você ainda escreve fantasia hoje em dia, então qual o problema?”. Repito, mas dessa vez em itálico: meu primeiro livro foi uma fantasia.
Eu tinha 14 anos, um repertório minúsculo, vivência quase nula e, tirando questões como:
eu viver repetindo que ia escrever um livro desde os meus 8 anos
ter escrito fanfics na internet;
ser um rato de biblioteca;
… Eu não tinha nenhuma noção de como escrever livros. A única coisa que eu tinha era boa base: a vontade de escrever. Fora isso, mais nada (literalmente o “ela tinha um computador e um sonho”).
O que eu achava que sabia sobre escrita era a pontinha do iceberg que hoje, onze anos depois, eu sei (e ainda estou aprendendo. Todos os dias aprendendo algo novo).
Dentro da minha bolha familiar, ninguém entendia coisa alguma de livros — além do fato de que eles deveriam ser lidos. E que custavam caro. Então, meu primeiro livro, uma fantasia chamada [NOME RETIRADO PARA PROTEÇÃO DA ESCRITORA], nunca foi publicado. E eu sempre agradeço por isso. Hoje em dia, na verdade, porque na época eu chorei de frustração. Eu era jovem, não fazia ideia de como o mercado editorial funcionava. Além disso, eu achava que escrever era a única coisa que eu precisava fazer. Que sonhar era a única coisa que eu precisava.
Repito: eu era jovem. E um pouco iludida (do jeito que os jovens costumam ser).
Meu primeiro romance era uma mistura de Os Instrumentos Mortais, com Sussurro, e com outros livros de romance sobrenatural que eu lia muito, já que era o que estava em alta na época. Sendo sincera — e justa —, eu acabei salvando algumas ideias desse primeiro projeto e tentei reescrever ele quando eu tinha 18 anos (eu ia postando capítulos no Wattpad), mas entrei em uma fase meio meu-deus-quem-sou-será-que-quero-mesmo-isso-para-minha-vida-argh e eu acabei deletando a minha conta, e perdendo minhas histórias que estavam nela.
Às vezes, fico triste quando penso nesse limbo de histórias perdidas, jamais recuperadas. Afinal, a gente dedica tempo para essas coisas… Para criar. Criar demanda esforço & criatividade. Hoje em dia, eu fiz as pazes com o fato de que apaguei tudo. Não sei se teria feito diferente, mas finalmente superei isso.
O que me leva ao primeiro tópico dessa newsletter: meu primeiro livro, fantasia, romance sobrenatural, nunca publicado, nove meses de escrita, mais de 500 páginas… Foi um grande exercício de criatividade.
Parênteses: Sendo BEM SINCERA, eu odeio o discurso de que situações ruins são ensinamentos na vida. Ninguém deveria aprender sofrendo. Ou passando perrengues. Enfim. Ninguém deveria aprender nada em cenários ruins. Mas a vida não é um morango e, às vezes, a gente tem que espremer algo das situações tenebrosas que a gente passa (ou se enfia).
Nessa época, eu estava aprendendo a unir uma palavra na outra, usando a super cola chamada Voz Autoral. Hoje entendo que não foi um desperdício de tempo e, frustrações iniciais superadas, tudo fez sentido na minha trajetória como escritora. Não só isso, mas construiu a escritora que eu sou hoje. Aquela primeira história era só um recorte dos livros que eu gostava de ler, das coisas que me atraiam naquela época. Terminar esse primeiro livro me mostrou que eu era capaz de terminar outros. Eu era capaz de criar coisas minhas.
Eu era capaz.
O que me leva até meu conselho para jovens escritores (e artistas): criatividade é um exercício. Ela é como um músculo: se a gente exercita ela, a criatividade se fortalece. Quanto mais arte a gente consume, mais arte a gente cria. É uma grande roda, que precisa ser alimentada de um lado, para que o outro lado continue, etc. Além disso, criatividade é uma palavra que não pertence somente a quem cria arte. Ela é e está em tudo. A vida cotidiana precisa de criatividade para existir já que criatividade é a capacidade de resolução de problemas. Depois que aprendi isso, consegui gerenciar minha vida criatividade de maneira menos brusca. Fui mais gentil comigo mesma e com o meu processo porque passei a entender ele.
Se eu paro de consumir arte, como vou criar? Se eu paro de ler livros, como vou escrever os meus? E é assim que a grande cola da Voz Autoral nasce. A gente precisa consumir, consumir, consumir para então poder criar — e criar-criar-criar. Se eu pudesse dar um conselho para quem está começando, ou para quem está tendo dificuldade em lidar com seu lado criativo, eu diria: mantenha a roda girando.
Leia muito e leia de tudo. Leia livros que você acha que vai gostar. Leia livros que você tem certeza que vai odiar. Gosto de uma fala do Stephen King, no qual ele diz que, muitas vezes, é o livro ruim que vai te ensinar sobre escrita — principalmente sobre o que não fazer com ela. Com o tempo você aprende mais sobre você, sobre o que você gosta, e então vai poder ter mais certeza na hora de abandonar livros e na hora de escolher os que vai ler.
Construa sua rede de referências. Além disso, todas as artes estão ligadas — cinema, artes visuais, música. Tudo, consuma tudo. Tenha fome de tudo.

para quem está começando (ou para quem quer se encontrar) na escrita (e na criatividade)
Hoje em dia, graças ao meu primeiro livro nunca publicado, só existe uma de mim (como já disse Taylor Swift em Me!).
A minha voz autoral foi construída através de todas as minhas tentativas, de todos os meus acertos, e também dos meus erros e de todas as histórias que nunca publiquei (que são um bom punhado).
E é por isso que ao mesmo tempo que minha escrita pode lembrar a de tal autora ou de outra autora, ela tem algo que só eu tenho — que somente eu poderia ter feito. Isso não aconteceu de um ano para o outro e nem foi fácil. Foram anos de escrita, cursos de escrita criativa, pilhas de livros sendo lidos e estudando sobre escrita criativa, fosse por cursos de extensão ou por minha conta.
Escrevo, acima de tudo, para mim mesma.
Mas levo a escrita a sério porque a escrita sempre me levou a sério.
O que nos leva a…

A VALIDAÇÃO DOS ARTISTAS NAS REDES SOCIAIS
A gente tá vivendo um momento bem… interessante… sobre as questões “quem cria” versus “quem consome o que está sendo criado”, e eu queria falar um pouquinho da questão de ego do artista + vida de escritor de uma maneira bem subjetiva — quero deixar bem claro que as fontes de tudo isso aqui sãos as vozes da minha cabeça, é claro (e alguns comentários feitos aqui e ali por pessoas que também escrevem).
Escritor agora tem um apêndice dentro das funções, que é ser influencer, e a gente tá vivendo uma época de MUITA rede social, cheias de vídeos curtos. Se você é escritor e não “cria conteúdo” (ou não mostra sua vida tim-tim por tim-tim) a chance de você ser escanteado pelo público leitor — ou até mesmo nunca chegar nele — é muito grande. Presença online é tudo para quem escreve hoje em dia.
E, sim, cada um escolhe o caminho que quer fazer — até porque destinos diferentes exigem caminhadas diferentes e está tudo bem — mas eu cresci com blogs e com muita coisa escrita na internet. Eu vi o Youtube ser criado, usei Orkut, Fotolog… Sou meio velhota nessa coisa de ter-rede-social. Além disso, em muitos casos, acredito que quando a gente escreve estamos buscando ser lidos. Estamos buscando um feedback, uma interação com quem leu algo nosso e gostou (de preferência), etc. As redes sociais facilitaram muito isso, claro, mas também abriram uns pontos bem estranhos, como por exemplo: já que eu escrevo livros, também tenho que escancarar a minha vida pessoal.
As pessoas não querem mais só consumir as histórias escritas, elas querem consumir o autor junto com o livro dele.
De novo: a gente meio que acaba refém das expectativas das bolhas leitoras. Com o tempo, fiz as pazes com o fato de que gosto muito do Instagram e, errr, do Twitter.
(Certo.
Gostar é uma palavra forte.
Eu uso muito o segundo, apesar dos pesares.)
Independente de tudo, quem cria parece estar sempre precisando de validação (oi, Síndrome de Impostor *aceno*). E, quem diria!, as redes sociais nos proporcionam EXATAMENTE isso: uma resposta rápida entre leitor-escritor que, se bem aproveitada, é algo super legal. Só que a internet vem sendo cada dia mais um lugar péssimo para se passar horas, e isso vem abrindo questões dentro da minha cabeça.
Não vou entrar muito no mérito da Síndrome de Impostor que corrói 100% de quem cria e expõe o que cria para o mundo — vou falar de validação mesmo. Se a gente tira a rede social de uma boa parte de quem escreve hoje em dia, parece que você tirou tudo, porque a vida criativa da pessoa está extremamente ligada a criar conteúdo e alimentar rede social — e aquela outra rede social; e mais essa rede social.
Eu venho tentando buscar validação em poucas redes sociais. Decidi abrir uma newsletter para escrever mais, manter menos desculpas na ponta da língua quando o assunto é escrita. É muito cedo para dizer se está funcionando ou não, mas que está me mantendo dentro de uma rotina de criatividade + constância + escrita… Isso está mesmo.
Cada autor busca para si o caminho que acha melhor para a própria carreira. De novo: isso tudo que eu estou comentando é subjetivo, vem de mim, da minha cabeça.
E eu acabei entendendo, de uns tempos para cá, que meu principal papel é escrever. Gosto de ter minhas redes sociais, gosto de postar foto do sorvete de queijo que experimentei, do meme que salvei, gosto de repostar vídeos que dei risada — mas minha principal obrigação é escrever.
Nesse momento, é escrever minha newsletter. Depois, minha novela que sai esse ano. E depois, o livro que estou programando desde 2020. E assim por diante. Não existe fórmula milagrosa para escrita. Quando a gente fala de arte, a gente não fala de REGRAS. A gente dá conselhos, dá dicas, mostra caminhos, e eu amo a literatura porque ela nos dá uma coisa que eu acho extremamente prazerosa: a subjetividade. O poder de decidir se algo está bom ou ruim para você.
Artista buscar sua validação não é um problema. Acho que o verdadeiro problema é tentar tudo, todas as redes, e se frustrar caso tudo dê errado, atrelando isso diretamente ao que você está criando. No meu mundinho ideal e perfeito, rede social não teria tanto peso na hora de decidir sobre a sua arte, mas já que isso não acontece, eu reforço: busque o que funciona para você.
Li um post muito legal da Bárbara Morais no Instagram esses dias, e outro do Guilherme Buiatti, e os dois falavam exatamente sobre isso: sobre como tiveram que descobrir onde o sapato apertava no pé deles. Não dá para gente ficar medindo nossa vida, nossa carreira, pela régua dos outros.
Então, se isso funciona para você: ótimo! Se não funciona, busque algo que faça mais sentido com a sua persona escritora. Você não precisar em todas as plataformas. Você precisa entender o que faz realmente cabe para você.
E falando nisso…
ROUBAR É UMA ARTE
e eu aprendi isso uns anos atrás, enquanto lia Roube como um artista, do Austin Kleon.
A newsletter de hoje ficou extremamente focada em criar, produzir, escrever — existir como pessoa que cria, como artista. Graças a isso, eu não podia deixar de falar sobre esse livro maravilhoso, que me ensinou coisas interessantes e é uma recomendação que eu faço para todo mundo que cria algo, que solta fumacinha pelas orelhas enquanto busca deixar sua marca no mundo.
Aquela história do nada se cria, tudo se copia é uma verdade gigantesca. É preciso roubar dos outros para podermos aprender a criar (como eu disse lá em cima, meu primeiro livro foi mais um recorte do que uma criação). Em tempos de notícias rápidas e imprecisão de fontes, eu acredito que seja mais necessário do que nunca reforçar da onde nossas referências surgiram. Citar pessoas que te inspiraram — ou quadros, ou músicas, ou outros autores, ou até mesmo uma anedota pessoal.
Eu gosto de assassinar a musa.
Eu odeio a falsa concepção de que personagens nascem prontinhos na cabeça. De que foi fácil. De que personagens são amigos que só você pode ouvir. Escrita é trabalho e todo trabalho vem de algum lugar. Eu acho legal, e justo, citar suas fontes. Quem fez algo primeiro — ou até mesmo quem você viu fazendo tal coisa. Ninguém cria nada do nada. A gente vive tempos cíclicos (vocês viram que os vampiros estão voltando de novo?) e todo mundo rouba de alguém, mas roubamos como artistas e, sendo assim, nada mais justo do que citar nomes de quem roubamos — ou pegamos emprestado, rapidinho.

recomendo OS DOIS livros para quem cria/escreve/produz
Depois de dizer tudo isso (ufa!) gostaria de reforçar o fato de que sou única, o que eu faço é ímpar, as minhas referências estão sempre sendo ditas.
As histórias que conto só poderiam ser contadas por mim.
Olhar para esses fatos sem arrogância é muito importante porque, às vezes, a gente se esquece do quanto trabalha. Às vezes, até mesmo o trabalho criativo entra no automático, a gente se deixa cair nas armadilhas dos pensamentos de “será se eu sou boa o suficiente?”, e esse é um caminho muito perigoso para seguir — independente do que você faça, do que você crie.
Voltando um pouquinho para a Síndrome do Impostor: mentalizar sobre a excepcionalidade que é a sua mente, as suas referências, as suas ideias, pode te ajudar a manter um ritmo constante de produção criativa. Claro que bloqueios podem acontecer, já que são inúmeros fatores que podem nos bloquear de escrever e/ou criar. Mas às vezes a gente precisa ser gentil com nosso lado artista e nos dar essa auto validação… Né?
Mas enfim.
Agora vou encerrando essa newsletter.
Tenho coisas para escrever.
Com carinho (mais uma vez),