- Ellipse
- Posts
- #03: maio - profissão fangirl
#03: maio - profissão fangirl
sobre flores, garotas & os perigos de ser fã
nessa EDIÇÃO:
novidades como autora;
mulheres adultas podem ser fã de algo?
um conto epistolar enquanto eu me preparo para lançar uma novela sobre garotas e portas mágicas;
NOVIDADE <3

Começando essa newsletter com notícias legais sobre minha carreira: agora sou uma autora agenciada. YAYYYY.
Agora sou representada pela Magh e minha agente literária é a Karoline Melo. Isso muda algumas coisas… e outras nem tanto (risos). Estou muito feliz com essa notícia e com a oportunidade — os planos de dominação regional apenas avançando!!
Caso você não saiba o que um agente literário faz: ele é basicamente a ponte entre autor-editora, que vai buscar o melhor lar editorial para o trabalho do escritor. Enquanto o autor escreve e cria, o agente cuida dos pepinos e de questões mais burocráticas (de maneira bem simples e resumida, é isso).
Comecei escrevendo fanfics em sites e hoje, doze anos depois disso, eu olho para trás e percebo o quanto eu cresci e amadureci na minha jornada como escritora profissional. Durante todos esses anos teve uma graduação inteira de Letras, cursos de escrita criativa, cursos de storytelling, cursos de produção editorial — eu estudei o que estava ao meu alcance e li, rabiscando ideias, buscando melhorar. E esse continua sendo meu plano.
Acho que — assim como todo mundo — eu faria algumas coisas diferentes, se eu pudesse.
Só que sinto que, por um lado, isso é injusto em alguns pontos, já que a Adrielli de hoje só existe pelas loucuras, humilhações e ousadias que uma Adrielli de 13 anos foi capaz de fazer e passar.
Sei que existe pessoas que me acompanham desde a pandemia (ou até mais recente ainda do que isso) e que o mercado editorial está girando, tomando novos ares, com pessoas novas (mais novas do que eu, inclusive), mas acredito sinceramente que consistência e amadurecimento são necessários para construir uma carreira que vai poder se sustentar com o passar do tempo.
Dito isso: os trabalhos continuam.
Deixo meu obrigada para Karol e Magh, pelo acolhimento.
Inclusive: a Magh tem uma newsletter também! Se vocês curtem saber sobre o mercado editorial e querem saber sobre as coisas dos autores da casa (cof cof eu inclusa agora), vocês pode se inscrever nela clicando aqui.
o crime das mulheres adultas
Fiz 25 anos em fevereiro e ao mesmo tempo que muita coisa mudou, algumas coisas permaneceram iguais. Acho que a gente acaba criando umas expectativas bobas sobre fazer aniversários — não sei a razão exata, mas eu mesma tinha muito medo dessa idade que tenho agora. Medo de ter falhado comigo mesma, não sei. Agora vivendo meus doces, caóticos e turbulentos 25 aninhos de idade, andei reparando em umas coisas que antes já me incomodavam, mas agora começaram a pegar em um calo muito específico: o ódio gratuito sobre mulheres que são fãs (de qualquer coisa. Sério. Qualquer coisa).
Eu sou o tipo de garota que quando gosta de algo, realmente GOSTA. Fico completamente hiperfocada,consumo tudo que consigo encontrar sobre a obsessão do momento. E eu tenho uma certa constância nos meus gostares e isso é um fato.
Não só digo isso, como também posso provar!
Antes do Youtube existir, eu brigava pelo controle remoto da televisão com a minha irmã mais nova. Enquanto ela queria assistir desenhos animados, eu queria muito ver MIX TV e foi lá que eu descobri Taylor Swift. Eu lembro de ouvir Our song, You belong with me e Love story assim, pela televisão. Lembro de baixar essas músicas por infravermelho!!!, depois por Bluetooth. Uma criança que cresceu transitando muito em questões analógicos e digitais.
Mais de uma década se passou e eu continuo ouvindo Taylor Swift de uma maneira bem… intensa. Acompanhei o lançamento de todos os álbuns que vieram depois do debute, fiz amizades por causa dela. Minha irmã não se lembra de uma época na qual não fui fã de Taylor Swift. E isso é meio doido (e legal ao mesmo tempo).
Quando eu tinha 12 anos, li Percy Jackson pela primeira vez. Eu já era uma consumidora assídua de mitologia grega e acabei assistindo o filme de antes mesmo de ler os livros. Acabei criando um dos grandes traços da minha personalidade ali.
Eu li, reli, escrevi fanfics, criei um tumblr temático, fiz amizades, fui ao cinema assistir O mar de monstros, era apaixonada pelo Logan Lerman — mais de uma década depois, e agora adulta, estou esperando a adaptação que vai ser lançada pela Disney e muito animada!!!
Também no início da minha adolescência, eu li muito a Meg Cabot. Todo livro dela que eu conseguia colocar minhas mãozinhas era como um banquete. Eu li o que eu encontrei nas bibliotecas das minhas escolas e li o que encontrei na biblioteca da cidade da minha prima, quando eu estava de férias. Assisti os filmes do Diário da Princesa e descobri A Mediadora.
Li muitos livros da Meg — alguns gostei mais que outros — e ainda hoje me pego relendo minha série favorita dela. Ouso dizer que tive minha personalidade moldada por Suzannah Simon e Jesse Desilva. Estou animada para a adaptação e esperando de coração que ela não seja engavetada.
Gosto tanto de livros.
Cresci lendo o tempo todo e as pessoas que conhecem desde criança sabem disso. Eu falo de livros na internet e, mesmo que não fizesse isso, acharia um outro jeito de falar sobre livros — porque literatura construiu quem eu sou. Tudo o que eu sou. Todas as minhas referências, meus bons momentos, grandes amizades, meus maiores sonhos e também minhas maiores frustrações. Cursei letras por causa disso e, mesmo dentro dessa decisão, a literatura continuou sendo meu terreno firme.
Alguns outros exemplos: ouvi (e fui obcecada por) One Dicretion a minha adolescência inteira e, hoje em dia, continuo acompanhando as carreiras solo dos meninos que eu era mais apegada. Descobri o kpop com 12 anos e até hoje acompanho meus grupos favoritos. Minha amiga me apresentou os mangás quando saímos do ensino fundamental 2 e eu nunca mais deixei de ler eles.
Alguém me apresentou bubble tea no começo da minha graduação. Eu me formei e continuo tomando o famoso chá de bolhas, a ponto das pessoas saberem que é uma das minhas bebidas favoritas.
Sou uma constante. Apesar de amar explorar coisas novas, gostos novos, mundos novos, eu também sou uma pessoa tediosa e previsível. As minhas coisas de conforto permanecem. Sou uma mulher de “gostar” intenso e eu gosto de ser assim. Gosto de mapear tudo que me faz bem, gosto de descobrir coisas novas que me ancoram no mundo real e que me permitem sentir coisas incríveis mais de uma vez.
Gosto de sentir muitas coisas porque parece que isso faz com que eu me torne alguém real — alguém que está vivendo, construindo traços de personalidade e se fixando como um ser perante o mundo.
Não quero completar uma idade e ser encaixotada e posta na Estante da Vida Adulta. Muitas das coisas que pontuei aqui em cima são justamente coisas que eu vejo gerando ódio contra mulheres adultas — afinal, uma mulher velha dessa e ainda escuta boyband? Ainda gosta de livro de romance? Sem falar no kpop!!
É extremamente óbvio que a régua que mede a vida das mulheres é sempre diferente. Homem ama futebol, videogame e qualquer outra coisa com intensidades tão parecidas quanto e ganham passe livre para isso, ainda assim são encaixados nesse discurso perpétuo de que são “apenas garotos”. Já a gente, quando é menina é ridicularizada por ter gostos específicos, e quando a é adulta, é praticamente um crime ser fã de algo.
Eu sempre uso Crepúsculo para falar disso porque é sempre um homem falando mal da saga.
Rolou uma perseguição e humilhação assustadora na época que os filmes e livros fizeram muito sucesso. Era mortificante pensar em falar sobre a saga, ou agir minimamente interessada porque era de praxe garotos (e homens) fazerem chacota.
A desculpa dada antes era que os livros/filmes eram ruins. E porque eles eram considerados ruins? Porque, de forma majoritária, eles eram pensados para um público feminino. O plot principal é o romance de Edward e Bella. As adaptações tiveram suas perdas e seus ganhos, também. Hoje em dia Crepúsculo é — eu ouso dizer — um clássico moderno. Ele moldou milhares de leitores e arrastou multidões de garotas-mulheres para assistir uma história de amor entre um vampiro e uma humana. Ainda assim…
Tem tanto, mas tanto livro ruim que não recebeu 1% do ódio que Crepúsculo recebeu. Independente da subjetividade de Crepúsculo ser bom ou ruim (afinal, quem define essas coisas? Quem anda por aí com o termômetro do Bom-ou-Ruim?), existiu uma questão massiva de ódio destilado em cima dessa história e, para mim, foi por questão de gênero — não só literário.
Eu vejo esse processo sendo repetido em muitas lugares. Como, por exemplo, quando livros de romance eram chamados de chick-lit (“livro de mulherzinha”). Ou com o boom dos dramas coreanos que, muitas vezes, focam nos romances e são bem docinhos quanto a isso (de novo: muitas vezes; não todas).
O problema no fim, não é o que você está consumindo ou a grande régua do Bom-ou-Ruim, mas sim o fato de que o público consumindo tal coisa ou outra coisa é, em sua grande maioria, feminino.
Quando a garota vira mulher adulta então… Isso se intensifica de uma maneira torturante. É impossível existir na internet como fangirl de qualquer coisa sem topar com um troll (nem todo homem, mas sempre um homem) despejando ódio em cima de uma coisa que não pertence a ele.
Enfim, né. Deixo aqui essa reflexão: essas coisas todas são ruins ou o público que consome elas é esnobado intelectualmente?
Existe uma régua real e precisa do Bom-ou-Ruim ou durante anos e anos quem definiu esse parâmetro foram homens? (Homens brancos. Homens héteros. Homens cis. Homens!).

de quando fui ver Crepúsculo, agora adulta, com minha grandíssima amiga Aline <3
antes do fim
Tô de ressaca literária. Ando lendo pouco e isso anda me deixando bem frustrada. Maaaaaaaaaas queria indicar algo aqui:

HOW TO GET MY HUSBAND ON MY SIDE — já comentei que amo isekais, manhwas e suspensão de realidade nas histórias que consumo, então sempre que acabo um eu já me vejo procurando algo novo.
Recentemente li esse manhwa, no qual a protagonista vem de outro universo e cai dentro da história de um livro que ela leu, acaba sendo a vilã, etc. Todo o clichê de sempre, que a gente já viu muitas vezes.
Eu gostei muito desse por causa das dinâmicas apresentadas, como o fato que a protagonista se finge de burra para tirar o dela da reta e o mocinho, inicialmente, é uma parede de gelo — não reage a nada dela, mesmo a coitada quase morrendo meia dúzia de vezes. A grande questão é que eles estão presos em um casamento político (hehehehe). O slow burn deles é muito gostoso e tô adorando a direção que o manhwa está tomando até agora.
(Tem o delicioso trope de “QUEM MACHUCOU A MINHA ESPOSA?” dito de forma furiosa por um interesse romântico lindo de cabelo branco. Como não amar?)

arte de @howlsjk
CELESTE DE CORAÇÃO MORTO GANHOU UMA ARTE SOLO — eu prometi que, se Coração morto vendesse uma quantidade X de ebooks antes do primeiro mês mandaria fazer uma arte solo da Celeste. FELIZMENTE isso aconteceu e eu pedi essa arte da a Howls. Eu tô completamente apaixonada pelo traço, cor, por tudo. O lançamento de Coração morto foi um divisor em algumas questões na minha cabeça, na minha carreira, e na minha vida como pessoa. Celeste é uma personagem tão antiga que esse mimo (para ela, para mim e para os leitores) foi mais do que justo.

escreverei o fim do mundo para você
por Adrielli Almeida

Acordei vomitando flores em uma manhã de fevereiro.
Não lembro o que sonhei, mas lembro que minha garganta coçou e senti minha pele derreter em cima dos ossos, meus olhos se abrindo de repente. Corri para o banheiro, as pernas trêmulas, a boca cheia. Quando cuspi, pétalas miúdas de margarida saíram.
Foi quando o fim começou.
Vomitei três vezes até que tudo tivesse saído. Senti meus olhos úmidos, as lágrimas se acumulando nos cílios. Vi as pétalas rodopiarem e sumirem quando dei a descarga. Foi ali que entendi que tipo de história eu teria que escrever. Meu dedos tremiam tanto. E eu pensei: caralho.
Você sabe que esse tipo de coisa é capaz de destruir alguém, não sabe, Ives?
Eu sabia. Soube antes mesmo de vomitar as flores. Por isso, não contei para meus pais. Não contei para você.
Na semana seguinte, comecei a vomitar margaridas inteiras — ainda sem caule. Mas lá estavam elas, boiando na água do vaso, brancas e amarelas, brancas e amarelas, brancas e amarelas. Então senti em meu peito um vazio inexplicável, e foi a primeira vez que vi você com ele. Estávamos paradas embaixo de um salgueiro, e estava quente o suficiente para as cigarras cantarem alto. E, nossa, como eu quis falar algo. Os machucados no seu braço gritavam para fora da camisa.
Acariciei cada um deles com os olhos. Eram cinco, e tinham o formato de uma mão.
Ives, eu deveria ter dado um passo para frente, mas senti que era como pisar no vazio do universo, como abraçar um precipício, como tentar gritar no espaço. Também não tive coragem o bastante. Você não disse nada, eu não disse nada, então costuramos silêncios como se fazem com as colchas.
Agora, vejo que nossos vácuos significaram coisas diferentes.
Ives, me perdoe. Eu deveria ter dito algo. Deveria ter sido clara. Deveria ter sido corajosa. Ou, no mínimo, sincera. Mas eu nos condenei a uma corda bamba ao recuar. Nessa mesma noite, vomitei a primeira margarida inteira. Dessa vez, o caule veio firme, e as folhas, verdes. E ela parecia tristemente bonita, úmida na minha mão.
Fiquei sem falar por dois dias inteiros.
Mas tinha certo sentido no castigo. Já que eu não tinha coragem de dizer nada, não deveria ser capaz de falar qualquer coisa.
Além disso, eu não sabia dizer se o fato de as margaridas serem suas favoritas era algo bom ou ruim. Foi assim que eu soube que estava morrendo de amor e que era uma escolha. Não vou mentir, Ives. Não foi difícil. E agora, enquanto escrevo, penso: deveria ter sido? Difícil, no caso. Eu deveria ter desistido enquanto era possível?
Em algum momento foi possível desistir?
Eu não sabia responder, Ives.
Ainda não sei.
Você deve estar pensando que as flores vieram lentamente, mas acho que isso varia. Varia de acordo com a forma pela qual seu amor por aquela pessoa nasce. E meu amor por você era mais do que qualquer uma de nós poderia aguentar. E te amei tanto — tão forte, tão rápido — que as flores acompanharam o ritmo.
Você era luz, estrela e calor. Você era o sol, e eu era as asas de cera de Ícaro. E você também era o mar, e eu, um grão de areia. Você era uma floresta inteira, e eu era uma formiga diante de tudo o que você representava. Eu estava pronta para isso, Ivie. Para ver você partir.
Mas não estou pronta para ir embora.
Há poucas escolhas agora; a cirurgia de remoção das flores não é mais possível. Elas já criaram raízes em meus pulmões e em meu coração. Se forem arrancadas, eu morro. Se elas ficarem, também. Enquanto escrevo isso, minha mãe olha pela janela bem ao meu lado. Seus olhos parecem uma nascente, e eu entendo que, mesmo não estando preparada, não havia mais o que fazer.
Só deixar te amar, Ives. Se eu fizesse isso, sobreviveria. Se abrisse a mão e soltasse o fio que me prende a você, eu me curaria. Mas poderia? Poderia viver em um mundo no qual não amo você? Conseguiria viver com o fardo de que você amará outras pessoas, mas não posso aceitar uma realidade na qual meu coração não canta pelo seu. Na qual minha alma não estende a mão para a sua. Como eu poderia deixar anos para trás?
E, Ivie, eu não amo apenas você. Amo tudo o que você é. Amo seus dedos finos, de unhas quadradas. E seu nariz pequeno, redondo. E sua pele marrom-escura e seus olhos cor de canela, e amo como os cachos de seu cabelo acariciam seu pescoço e como você mordisca a almofada do polegar quando está nervosa. Amo seu rosto quando você sorri, e amo ainda mais quando chora. Seus olhos se tornam luas minguantes, e sua expressão é tão aberta e tão vulnerável, e você está ali. Logo ali.
Como eu poderia deixar de te amar? E como poderia dizer todas essas coisas? É preciso mais do que palavras para ser corajoso, Ives. E eu nunca fui corajosa. Nunca serei. Mas se as palavras são metade do caminho, aqui estão as que posso te entregar.
Não sei se você entendeu ainda, Ivie, o tanto que quero ficar. O tanto que amo você. Pense que, se você me pedisse o mundo, eu te entregaria o universo. Se me pedisse uma estrela, eu embrulharia o sol. E se você quiser que tudo acabe agora mesmo, eu mesma escreverei o fim do mundo para você.
Seria fácil assim.
Ah, Ives.
Nosso tempo está acabando, e eu sei que você está lendo isso sozinha, mas onde? No velho balanço em frente à sua casa? Ou sentada em cima da cama, de frente para a janela? Será de madrugada? Gostaria de saber se você chorou por mim, porque percebi que, durante todo esse tempo, minhas lágrimas correram na direção do oceano que é seu coração.
Elas sempre foram suas e sempre foram por você.
Se puder, Ives, não me esqueça.
Mas se nem isso for possível, guarde esta carta.
A esta altura, já estou vomitando buquês de margaridas. Não me resta tempo nenhum. Não me resta nada além do adeus.
Em uma manhã de fevereiro, acordei sabendo que amava você. E esse foi o começo do fim.
Nada mais justo, sendo que você também foi o meu começo de tudo.
Eternamente sua,
Hana.
P. S.: Não leve margaridas para o meu túmulo. Estou cansada delas nesta vida.
P.P.S.: Vamos nos encontrar novamente, Ives. Na próxima vez em que nossos caminhos se cruzarem, prometo ter coragem para te amar do começo ao fim, e quando chegarmos ao fim, pularemos de volta para o começo.
Desse jeito, não teremos tempo para desistir nem para ter medo.
Nos vemos na próxima vida de Hana e Ives 👀
Com carinho (de novo!),